Um Ano Sabático – Parte VI

Siena, nunca te vi sempre te amei

De Florença, eu pretendia ir para Veneza. Mas então, aquelas coisas que acontecem ao acaso… Um dia, em São Paulo, logo depois que iniciei meu sabático, fui jantar com três amigas e comentei que estava indo para Itália. E uma delas, a Bia Perotti, comentou que estaria na Itália no mesmo período que eu. Ela tinha um casamento em Siena. Ficamos então de nos falar por e-mail e, quem sabe, nos encontrarmos lá.  E assim foi. Eu estava em Florença quando trocamos alguns e-mails e acabei confirmando minha ida a Siena para conhecer a região da Toscana. Algo que eu sonhava há tempos.

Não tinha ideia de como seria Siena. Não pesquisei na  internet, não pedi dicas, nada. Minha única (romântica) referência era o filme Sob o Sol da Toscana. E sabia que seria uma boa base para conhecer a região. Segui de ônibus para Siena sem grandes expectativas e comemorando que seria bom ter alguém, uma amiga, para dividir comigo os vinhos da Toscana.

Cheguei em Siena no início da tarde. Não me pareceu assim… uma emoção, mas eu lembrei que só estava lá porque queria explorar as cidades menores. Saí para explorar a cidade e então descobri… Siena é linda. Caminhando entre uma ruela e outra encontrei a Piazza Del Campo. E perdi o ar.  Novamente senti aquele arrepio pelo corpo todo e aquela sensação de pertencer ao lugar. Os pensamentos emudeceram e  fiquei lá um tempo literalmente parada, sem ação nem para fotografar. Só enxergava uma praça dourada onde as (muitas) andorinhas dançavam e faziam acrobacias no céu. As crianças corriam pela Piazza anunciando as férias. Um cachorro e algumas pombas disputavam um espaço para beber a água da fonte ao lado. Eu podia sentir a aura poderosa da cidade. Foi amor à primeira vista. É imponente, grandiosa, mas sem ser ostensiva. Uma arquitetura única. Muitos jovens nas ruas. Então comecei a fotografar. Mas confesso, receio que nenhuma foto conseguiu captar e reproduzir a beleza daquela tarde em Siena.

Durante essa viagem, notei algo novo em mim. Começou em Florença. Um dos sinais que indicam que amei a cidade é quando começo a fotografar  as placas de “aluga-se” ou “vende-se” ou os Bed&Breakfast charmosos. Como se eu não quisesse mais ir embora ou ficar um tempo a mais.

Por conta da alta temporada, estava cada vez mais difícil conseguir uma boa hospedagem em Roma, por isso eu já havia decidido seguir para a “cidade aberta” na semana seguinte; assim eu teria cinco dias na Toscana… Mas não queria alugar um carro porque queria degustar os vinhos, e confesso, fiquei tensa só de observar o jeito italiano de dirigir. Já moro numa cidade caótica, pra que andar de carro? Entendi que não ia dar conta e  resolvi dar foco em três cidades aonde eu poderia chegar de ônibus: San Gimignano, Volterra, que por ser mais longe e de difícil acesso de ônibus, acabou sendo trocada por Montalcino, e Colle di Val d’Elsa. E no último dia, ficaria em Siena. E assim foi.

Eu achava que já sabia ou conhecia a dolce far niente… ledo engano. É na região da Toscana, no campo, onde definitivamente eu entendi o que é a dolce far niente, a dolce vita. Os filmes, Sob o Sol da Toscana e Beleza Roubada, não exageraram. É tudo verdade (aliás, confiram no blog o post com dicas de filmes e uma playlist para você ouvir, no trem, no ônibus ou de carro pela Toscana). 

E então começou a farra… Sim, porque a Itália é uma farra. E na primavera, e na Toscana, é festa todos os dias e todas as noites.

San Gimignano parece de mentirinha

É muito fácil ir de ônibus de Siena para San Gimignano. Tem ônibus direto, padrão turismo – com poltronas estofadas e ar condicionado – com certa frequência de horários e você não precisa dirigir. Melhor que isso?! É divertido andar de ônibus. Cheio de turistas e não turistas. E claro, com emoção – curvas, buzinadas, freadas, paradas – afinal, estamos falando da Itália. Não sei nada sobre carros, e nem conheço o mundo, mas os italianos são os melhores motoristas do mundo.

San Gimignano parece de mentirinha. O cenário é muito parecido com um joguinho que eu brincava quando criança. É cheia de torres. A cidade chegou a ter 72! Mas depois de tantas batalhas, guerras e invasões, restaram 14 mas muito bem conservadas, quase originais. Subir na “Torre Grossa” é parada obrigatória para sentir e contemplar vista que se estende pela Toscana. É uma benção.

É uma cidadezinha encantadora e bastante turística. Lojinhas, cafés, bares, gelaterias, restaurantes convidativos. Quase impossível não parar em um deles. Estava um dia muito quente. E minha primeira comprinha na Toscana foi  um chapéu que me acompanhou até Roma. Além dele, descobri uma loja de joias artesanais e não pude resistir: trouxe comigo um lindo bracelete. Assim como é quase impossível você caminhar sem parar para fotos.

Além da paisagem da cidade – as construções medievais todas do mesmo tom – você está envolta/o naquele cenário típico da Toscana com direito ao aroma dos jasmins em todo lugar. Era um dia bem quente e o Sol reinava absoluto, sem uma nuvem no céu, mas soprava uma brisa e o cenário não poderia ter sido mais perfeito: o vento espalhava pluminhas brancas de uma flor típica da região por toda a cidade. Eu não sabia se estava numa tela de pintura ou numa cena de cinema.

Fôlego recuperado, hora de um spritz seguido de um almocinho leve com vista do paraíso. Um brinde a dolce vita e voltamos à praça principal, onde turistas ora disputam lugar nas filas das duas gelaterias que concorrem ao título de “melhor gelato” de San Gimignano, ora exploram os melhores ângulos para as fotos.  Os moradores reunidos, observam aquilo tudo, conversando ou tirando uma soneca, mas curtindo preguiçosamente mais um dia se despedindo.

Montalcino, entre umas e outras (taças)

Ir para Montalcino de ônibus foi uma aventura. Primeiro, para descobrir de onde partia o ônibus. Detalhe, eu estava hospedada em um hotel em frente ao ponto de ônibus, de onde saiam vários ônibus. Até para Roma. Mas não para Montalcino. Somente da estação ferroviária é de onde partem os ônibus para Montalcino. Até aí, sem problemas. O problema foi conseguir essa informação no ponto de ônibus central e nas bilheterias. Depois disso, descobrir aonde era a estação ferroviária foi outra aventura. Em alguns lugares da Itália é necessário ter uma paciência quase zen budista. Eu mantive a minha mesmo quando a atendente da bilheteria fumava e falava no celular, despreocupadamente, enquanto na fila, eu e outras pessoas esperávamos para ser atendidas. Fazer o quê?!  Cheguei a dar risada e lembrar de um ensinamento budista “aprenda a deixar as coisas pra trás”. Pensei, quanto ou como aquilo faria diferença na minha vida? Talvez naquele dia eu perdesse o ônibus por conta da moça que não estava colaborando. Talvez não. Vamos nos preocupar com o que é importante e deixar as coisas pequenas pra lá. E no fim tudo é muito pequeno.

stazione era, é, muito próxima ao centro histórico turístico de Siena. Eu e minha amiga tentamos encontrá-la munidas de nossos celulares e do Google Maps (que é uma mão na roda minha gente), mas por conta das muralhas e dos “castelos casas”, não conseguíamos sinal. O jeito foi seguir perguntando e confirmei o que já tinha concluído tempos atrás numa viagem para Paris e Aix-en-Provence: quando você quiser uma informação pergunte aos estudantes. Literalmente, peça ajuda aos universitários. Em geral eles falam em inglês e/ou estão mais disponíveis para ajudá-lo. Foi o que aconteceu também nessa viagem. Vi um jovem e perguntei  a ele. Por coincidência, ele também estava indo para lá e sugeriu que nós o acompanhássemos. Além de conseguir a informação, tivemos a oportunidade de conversar um pouco. Ele era da China e estava estudando arte em Siena. Um contraste e tanto.

Chegamos no horário de pegar o ônibus e então eu entendi porque não víamos a estação (apesar de não haver também nenhuma indicação informando a direção). Siena está “tão no alto” que para chegar a estação você tem que descer, descer muito e  escadas rolantes… Sim! Achei isso muito interessante e lembro que pensei, quando é necessário e há vontade, as pessoas sabem como ser criativas e fazer as coisas de acordo com o que se oferece.

Montalcino fica no alto de uma colina. É uma cidadezinha linda e para quem não sabe é famosa por ser a produtora do famoso vinho Brunello de Montalcino. A cidade, como várias na região, está entre muralhas, e a ordem é subir, e põe subir nisso. Algumas ruas chegam a ter um corrimão para dar uma forcinha…

Ao contrário de San Gimignano, a cidade estava bem tranquila. De tão tranquila  parecia que a cidade toda dormia. Mais uma vez, fazia um dia lindo e de Sol.

Logo na entrada da cidade uma praça, com uma vista que se estendia pelo campo, três pessoas – artistas, pintores –  conversavam e tomavam um lanche na praça durante sua pausa. Parecia realmente que o tempo havia parado ali. Com lojinhas e casas charmosas com floreiras, áreas públicas, jardins e bancos para passar o tempo.

Como era de esperar, nos rendemos e paramos em uma simpática lojinha de bijuterias. A proprietária, uma chinesa, contou que foi um dia de férias e nunca mais voltou. Na loja, uma inglesa, fez o mesmo caminho e investiu num lindo hotel na região

Quando você já começa o dia assim, o mundo se torna cor de rosa e parece que todo mal deixa de existir. E eu, toda às vezes que ouvia estórias como estas, saía fotografando as casas para alugar ou vender.

Como sempre, a ideia era fazer o reconhecimento da cidade, e depois, o reconhecimento dos vinhos!!! Depois de andar e fotografar a cidade escolhemos um restaurante charmoso e fizemos a tal degustação dos vinhos de Montalcino. E assim foi-se a tarde em Montalcino com direito a gelato, que não poderia ser de outro sabor: Brunello de Montalcino!

Alguns Brunellos e nos demos conta que não sabíamos qual era o horário do ônibus de volta para Siena… Corremos atrás da informação no centro turístico, compramos nossos bilhetes e nos despedimos de Montalcino.

Estávamos no horário, entretanto, esperamos, esperamos… e nada. Não tínhamos como confirmar se o ônibus já tinha passado. Enquanto isso, em nossa direção nuvens pesadas se aproximavam e parecia que uma tempestade era certa. Já o ônibus…

Finalmente, quando já estávamos pensando em pedir abrigo, uma mulher se juntou a nós e perguntei a ela sobre o ônibus. Ela também não sabia, pode ser que chegasse em uma hora, uma hora e meia… ou talvez não chegue, pensei. Ela era de um país africano, que não lembro agora, e estava lindamente vestida com seus trajes tradicionais. Muito simpática ela sugeriu que para fugir da chuva pegássemos um ônibus até Colle di Val D’elsa e de lá outro ônibus para Siena. E assim foi. Nos despedimos em Colle, e de lá pegamos um ônibus circular para Siena. Naquele cenário, ela, eu e minha amiga. Três mulheres diferentes, de culturas diferentes.

Na volta para Siena apesar do cansaço, lembro de ter pensado, quantas “fronteiras” essas três mulheres que encontramos hoje, e o jovem em Siena, não teriam rompido para estar lá na Itália da dolce vita?! Me senti muito pequena e ao mesmo tempo com longas asas nesse dia.

2 comentários COMENTE TAMBÉM

Oi! Bia

Amo as histórias da Kareen, minha inspiração porque amo viajar e meu sonho é sair pelo mundo sem rumo e sem hora para voltar.
Karren!! bjs e grande abraço.
Estou aqui a espera de mais viagens.

Ana Cristina

Olá Ana Cristina! Muito obrigada! Eu também 😉
Em breve tem vem mais posts
Beijos

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