Modefica – moda e estilo de vida cool e consciente

Já falei aqui sobre o Modefica, uma plataforma (site + loja) que traz um conteúdo muito cuidadoso sobre moda, comportamento e estilo de vida, além de uma ótima curadoria de produtos relacionados.

A proposta editorial é bastante sólida e interessante:

 “Modefica é um site para mulheres feito por mulheres e tem como princípio básico a moda e o estilo de vida consciente. Mas quando falamos consciente queremos dizer um monte de coisas como: valorizar a moda e a cultura Brasileira, respeitar os animais – todos os animais – e o meio ambiente, entender o impacto das nossas escolhas de consumo para o mundo e mostrar que é fácil fazer substituições na hora de consumir moda e estilo de vida que vão, na prática, tornar o mundo em que vivemos melhor”.

Em agosto, a iniciativa comemora seu primeiro aniversário com um evento de dois dias em São Paulo (dias 8 e 9), o Modefica Offline, com conversas, live-painting, música, comidinhas veganas deliciosas — como o hambúrguer  do Move Institute — e loja pop-up. O lucro será revertido à ONG Cão sem Fome. Ainda dá tempo de se inscrever nos bate-papos aqui.

Conversei com a criadora e editora-chefe do site, Marina Colerato, que contou um pouco da sua jornada e principais desafios para o Achados.


Você é vegana há quanto tempo? Como foi o processo de transformação e como essa decisão afetou e afeta sua vida?

Apesar de viver tentando diminuir o sofrimento que meu consumo e estilo de vida possam gerar na vida dos animais, o que, para mim, é a essência do veganismo, eu não me auto-intitulo como vegana, pois acredito que o movimento (e o termo em si) é cheio de vertentes e nuances complexas.

Sou vegetariana há pouco mais de três anos e foi uma transição tranquila. Eu nunca comi “carnes exóticas” como carneiro, pato, coelho etc. Mas eu nunca havia tido contato com o vegetarianismo e tenho certeza que se esse contato tivesse acontecido antes, eu seria vegetariana há mais tempo. Sempre fui sensível para com a causa animal. Eu descobri esse universo através do livro da nutricionista americana Kimberly Snyder, The Beauty Detox Solution. Depois de ler o livro cortei a carne de vaca, depois o porco, depois o frango, o peixe, o ovo e o leite – que já não consumia muito por ser intolerante à lactose – e depois vieram atenção aos detalhes como gelatina, cochonilha e essas coisas menos óbvias.  Dai foi um passo para cosméticos, moda, e tudo que pudesse envolver sofrimento animal.

Eu me tornei ainda mais sensível com relação à causa animal e ao meio ambiente, e também estabeleci nova conexão com a comida e descobri um mundo de sabores. Quando era criança, passava muito tempo com a minha mãe ou minha vó na cozinha, ambas cozinham, então desenvolvi um apreço pela culinária e um certo dom. Por isso fazer minha própria comida, o que é uma barreira para um monte de gente, não foi nada difícil pra mim. O vegetarianismo só fez com que eu me aprimorasse mais, descobrisse novos ingredientes e possibilidades.

Eu me tornei mais paciente também. Você tem que se tornar paciente para ouvir tantas e tantas vezes o mesmo questionamento e críticas sobre a alimentação que você escolhe para si e não surtar. Risos. Mas é muito legal porque muita gente à minha volta aderiu à causa, além de eu conhecer um monte de outras pessoas e iniciativas que dividem dessa mesma vontade de mudar o mundo.


E como surgiu a ideia de criar um espaço para falar de moda e estilo de vida consciente, como é o Modefica?

Eu me formei em design de moda e trabalho com pesquisa de tendências. Com esse contato diário com o universo de moda, marcas, desfiles etc, comecei a me cansar de ver sempre as mesmas coisas e sempre as mesmas marcas nas mídias (muitas delas inacessíveis para a maioria dos apaixonados por moda). Pensei que poderia criar um espaço para destacar novos designers que não têm muita vez no difícil mercado de moda nacional.

A ideia de um site que destacasse uma moda mais autoral foi evoluindo conforme eu fui evoluindo como pessoa e consumidora, e me tornando mais consciente sobre os problemas que rondam o consumo desenfreado dos dias atuais. Além do mais, eu sempre me incomodei com o approach da maioria dos sites e revistas para com a moda. É uma indústria tão valiosa, que afeta a vida de milhares de pessoas pelo globo e que movimenta mais de três trilhões de dólares, não há nada de fútil nisso tudo e no impacto que ela causa. Com tudo isso em mente, o Modefica nasceu já focado em moda autoral, consciente e que compartilhasse de valores além do estilo. A ideia inicial não era bem essa, mas fico feliz que tenha se desenvolvido assim.


Como foi o primeiro ano de vida do site?

Foi difícil e de muito trabalho, mas muito recompensador. Eu conheci pessoas maravilhosas através do site, e recebemos alguns emails e contatos de gente que repensou a vida por conta do Modefica. Isso foi incrível. Somos sempre muito criteriososas com as matérias que vamos publicar, as marcas que vamos apoiar, as colaboradoras que vamos ter etc. É um emprego complexo de tempo, queremos ser uma plataforma diferente e única, e esse primeiro ano foi de descobrimento.


Quais os maiores desafios para o Modefica hoje?

O Modefica fala um monte de coisas que ninguém quer ouvir. Nós cutucamos e mostramos que não está certo levar a vida do jeito que nós – como sociedade – estamos levando. Que a crueldade não faz o menor sentido já que temos tecnologia para suprir nossas necessidades com muito menos impacto no meio ambiente, e que se você compra uma camiseta de R$ 10 feita em Bangladesh você está, muito provavelmente, endossando trabalho escravo. Quem quer ouvir e ver o verdadeiro horror por trás das próprias escolhas? Quase ninguém, né?

A gente fala que o que as pessoas consomem não é só da conta delas, é, na verdade, da conta de todo mundo já que dividimos o mesmo planeta. E é exatamente isso que é complicado porque nós, seres humanos, tendemos a nos proteger e fincar o pé na zona de conforto com o pensamento “minha vida, minhas escolhas, problema meu”. Mas não é assim, e muita gente foge disso, foge dessa realidade. Acredito que esse seja nosso maior desafio, falar para quem não quer ouvir. Queremos chegar em mais pessoas, tocar mais mentes e corações para repensarem seu estilo de vida – cada pequena atitute conta.

Também tem a questão de quebrar estigmas. A palavra “eco”, por exemplo, é frequentemente associada a algo chato ou sem graça e nada fashionista. Mas não é assim. A Stella McCartney é super eco, ela foi a responsável por incentivar várias mudanças positivas dentro do grupo Gucci, do qual a marca dela faz parte, e a moda da Stella não tem nada de chata ou sem graça. Então tem isso também: mostrar que moda eco é cool, que produto orgânico não é a mesma coisa que produto light e que tem muita coisa feita no Brasil que é mais bacana que coisa feita na gringa, por exemplo.


Quais outros sites e revistas você recomenda para quem quer ser um consumidor mais responsável e bem informado?

 No Brasil tem a Bruna Miranda que faz o Review, tem a Litza Mattos do Moda Verde, e tem as blogueiras Nyle Ferrari e Karina Veiga do Acorda, Bonita, que abordam o universo dos cosméticos. Mas aqui no Brasil, se moda é um negócio relativamente novo pra gente, imagina moda consciente e cosméticos veganos e naturais! Estamos todas aprendendo e meio que começando, por isso, é legal olhar também os sites gringos como oEcouterre e  Eco Fashion Talk, da Sass Brown, pioneira no quesito moda ética e sustentabilidade na moda. Para quem gosta de make-up, a Tashina Combs, do Logical Harmony, que é tipo a guru dos cosméticos veganos, é a melhor dica que eu posso dar. A Tashina não segue listas simples de “marcas que testam e não testam em animais” que estão, quase sempre, erradas. Ela vai atrás e tá sempre atualizada. Ela fez um trabalho recente com a Kat Von D de transformar todos os produtos da linha de make da Kat em vegan-friendly. Em lifestyle no geral tem a Franziska Schimid, do Veggie Love, alemã que aborda moda e lifestyle eco, que está em Berlim, o centro da sustentabilidade no mundo.  Com essas dicas, é possível ir descobrindo vários outros sites e blogs.

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Marina Colerato por ela mesma:

De São Paulo, já naveguei pelos mais distintos meios da moda. Comecei crepando sapatos em backstage de desfile, trabalhei na área de marketing de moda, conheci o chão de fábrica do Bom Retiro, tive experiência como stylist e depois fui para a redação online. E do meu amadurecimento não só profissional, como também pessoal e espiritual, somados ao meu gosto nato pela dinâmica da internet (afinal, sou da geração Y) e pelo jornalismo informativo, que surgiu o Modefica. Compartilhar, questionar, informar e ser ativa em defender causas que precisam de atenção sempre com uma pitada de moda, comportamento, cultura e estilo é a nossa missão. À parte disso, meu amor é compartilhado entre minha família, meus 8 cachorros resgatados das ruas, livros, cineminha, pâtisserie vegana e rock n’ roll.

Saiba mais sobre o evento Modefica Offline aqui.