ANO SABÁTICO – PARTE X

Se sua ideia sobre Nápoles se resume à pizza, tarantela, San Gennaro, roupas penduradas nas janelas e… à máfia (opa, que ninguém nos ouça), surpresa… Sim, é isso, mas muitas outras coisas legais.

Nápoles não fazia parte do meu roteiro, assim, pra ficar… Eu pensei em fazer um “check in/out” rápido – desembarcar e embarcar na estação de trem, comer uma pizza, olhar a baía, dar uma volta e ciao. Mas quando estava em Sorrento decidi estender minha estadia e montar minha base lá para conhecer Pompéia  e Herculano que ficam praticamente no meio da viagem entre uma cidade e a outra pela linha Circunvesuviana! Sim, a linha do Vesúvio. Já estava mesmo no clima do sul da Itália, e mais que isso, tenho raízes em Nápoles. Meus bisavós por parte de pai, Francisco Antonio Scorse e Filomena Severino, e minha avó Josefina, eram napolitanos. Vieram para o Brasil e Josefina se casou com Rynaldo Terenzzo (há indícios que o correto seja Terenzi ou Terencio),  também italiano, e da Calábria. Tinha ouvido falar especialmente mal sobre Nápoles – caótica, suja, perigosa, grosseira. Mas resolvi “correr o risco”, honrar a cidade que originou parte do meu DNA e conhecer mais sobre Partenope, a Riviera dos romanos da antiguidade, que depois veio a se chamar Napoli! Pois é, aquele meu livro, “Férias Pagãs” ainda me acompanhava.

Fiquei hospedada num lugar bacana e bem localizado. Pertinho da Via Toledo, no centro histórico que, como tudo, na Itália também, é patrimônio da Unesco, e onde só circulam pedestres. E bem perto da estação de metrô Dante para garantir o acesso fácil à Circunvesuviana.  A primeira surpresa foi chegar no hotel: no 4o andar de um prédio bem antigo… já me imaginei arrastando a mala, mas não, pude contar com um elevador charmoso, daqueles que não se vê mais, bastava colocar uma moedinha de 10 cents de euro! Curti esse “improviso”, coloquei minha mala mas desconfiada preferi subir de escada. Logo depois descobri que o prédio não era só mais um prédio antigo, ele tem também uma importância sócio-política contra o fascismo! Pronto!!! Saí inspirada para descobrir minha porção napolitana.

Nápoles é uma cidade grande. Descobri que é a terceira cidade mais populosa da Itália, perde para Roma e Milão. Bem menos turística que Roma, à primeira vista é tão barulhenta e bagunçada quanto mas depois tudo me pareceu… fácil. É uma cidade “viva”. As casas e apartamentos mais antigos, próximas ao centro histórico, estão no alto da cidade, nas colinas! Adorei isso. São elas que formam aquele skyline de “casas penduradas” especialmente bonito se visto a partir do mar.

Não posso dizer que me aventurei tanto assim, mas caminhei o bastante, usei o transporte público, fui na lavanderia, conversei com pessoas no metrô, me senti bem à vontade, exceto pelos sustos constantes com as scooters que surgem das ruelas “meio do nada”. E dei muitas risadas (e me identifiquei) com o “humor mal humorado” despachado irônico dos napolitanos. Como no dia que parei numa doceria linda e vi meu doce italiano preferido, o canoli siciliano (que só compete com o tiramisu)!!!! Pedi para a atendente naquela tentativa de um italiano arrastado, “per favore uno cannoli sicilliani”. E ela olhou bem pra mim e respondeu: “che cannoli sicilliani? Qui abbiamo solo napolitano!!!”. E caímos as duas na risada. Ou como o dono da loja de queijos e frios aonde parei para comprar um panini, que pensou que eu era italiana e quando falei que era brasileira mas que era neta de uma napolitana, fez uma festa e pediu pra tirar uma foto comigo. Nápoles é divertida!!!!

Muitas igrejas (muitas mesmo), museus, exposições e eventos na cidade. Mas eu queria focar em Pompéia e Herculano. Meu interesse talvez fosse menos histórico e mais “romântico-aventureiro” – sou meio fascinada por vulcões, provavelmente influenciada pelas histórias de Julio Verne. Comprei os ingressos antes e reservei uma parte do dia seguinte só para Pompéia e o resto para Nápoles! Queria meus momentos de calma para sentar num café e ficar sem fazer nada. Confesso que estava bem cansada também de tantas informações, de tirar fotos, mas como não conhecer? Conhecimento sempre é sedutor e irresistível…

POMPÉIA

Todo mundo já ouviu falar sobre Pompéia e Herculano, as cidades destruídas pelo Vesúvio no ano 79dC. As cidades ficaram adormecidas séculos e foram descobertas somente no século 16. Já o Vesúvio deu um pouco mais de trabalho, mas desde 1944 está lá, calmo, tranquilo… entretanto, dizem que deve entrar em erupção novamente num futuro próximo. Pompéia era uma cidade importante, tinha pouco mais de 20 mil habitante e através de pesquisas e indícios arqueológicos durante sua existência foi a cidade dos prazeres dos romanos da alta classe média. Por conta disso, os  religiosos da época atribuíram a tragédia à fúria dos deuses que resolveram castigar Pompéia pelo seu estilo de vida.

Exploradores mais atentos, após sua visita, contam com detalhes sobre as casas, placas das casas, as funções de cada peça encontrada, e com quase todos que conversei que estiveram lá, antes durante e depois, todo mundo quer saber onde era o prostíbulo… Ora, pensei, deixemos os mortos em paz. Confesso que minha visita não seguiu assim. Não havia mapas disponíveis e não queria ficar “refém” de guias ou de um audio-guide. Pompéia é graaande e o Sol estava impiedoso. Impossível lembrar ou anotar tantos detalhes. Fiz uma breve pesquisa na internet antes e segui meu caminho, mais de olho na paisagem e nos detalhes que renderiam boas fotos.

HERCULANO

Herculano é bem menor que Pompéia, era habitada por cerca de 4 mil pessoas mas mais próxima ao Vesúvio. De acordo com as pesquisas científicas ambas as cidades foram destruídas em 24 horas. O vulcão começou a expelir rochas e material vulcânico atingindo Pompéia e poupando Herculano, por conta do vento. O vulcão não demonstrava apresentar perigo, até que houve uma explosão maior e em questão de minutos Herculano foi totalmente soterrada pelas lavas vulcânicas. Isso, ironicamente, fez com que a cidade se mantivesse mais preservada e portanto hoje, mais bacana de ser estudada e admirada. Já Pompéia foi sendo destruída ao longo de 24 horas. O fato interessante disso tudo, e que eu não sabia direito, é que essa foi a primeira tragédia tóxica vamos dizer assim,  que a humanidade viveu. O que matou na verdade a população das cidades foi uma nuvem tóxica de cinzas e gases – as pessoas morreram asfixiadas e depois queimadas.

As principais descobertas das cidades estavam em Londres, no British Museum na exposição “Life and death”. Como depois acabei voltando para Londres (pronto já contei!!!) aproveitei minha estadia lá e fui ao British concluir minha visita,

(Herculano conta hoje com apoio da Inglaterra, acho que do próprio British Museum, nas pesquisas arqueológicas e conservação da cidade).

O sentimento de liberdade é realmente estranho. Pode confundir e fazer você “entrar em pânico”. Chegou o dia de deixar Nápoles, eu mesma queria partir, mas não sabia para onde… Simplesmente fiquei lá cinco dias e fui deixando para decidir depois e então chegou o dia e fiquei lá na estação de trem, parada, sozinha. Me senti o personagem do Tom Hanks no filme “Terminal”, sabe? Só que nada me prendia a não ser minha própria indecisão. Vontade, eu tinha de ir para todos os lugares. Mas tinha que escolher um. Uma opção era pegar um barco, uma ferry boat, e ir para Sicília. Outra opção, que surgiu de repente, era ir para Bari encontrar um amigo que ia participar de um festival de arte, tocando com um grupo de brasileiros. Ou eu podia seguir para Veneza… Faltava Veneza no meu roteiro! Mas já era alta temporada e algo me dizia que eu ia ficar louca e aborrecida com tantos turistas além de mim mesmaVeneza agora não, pensei, Veneza quero só pra mim (até parece, risos). E havia a possibilidade de ir para Amsterdã. Uma amiga e sua família acenaram quando coloquei os pés na Europa, “vem pra cá”. E claro, Londres, que já considero meu segundo lar.

Eu estava empolgada em permanecer na Itália, al mare, mas a opção de Bari “travou”. Ficou uma coisa é mas pode não ser, e entreguei pra vida, literalmente, até que chegou esse dia… eu não sabia se pegava um barco, um avião ou um trem, e confesso, passei uma tarde literalmente parada! De repente deu um cansaço. Mental  físico e emocional.  Homesick, dizem. Ou no nosso idioma, saudades! Saudades “de casa”. Ou de uma casa. Me rendi à oferta de casa com cara de casa, colo e aconchego metza brasileiros metza holandeses da Arlete, da Stephanie e da sua família linda, naquela delícia de cidade que é Amsterdã.